Cinema e CriaTVdade

Percepções, olhares apaixonados, risos, lágrimas, medo. Sensações apreciadas a cada filme, música, leitura independente de idioma, cultura ou gênero. Eis um convite aos apreciadores de arte: um bom bate - papo daqueles sem hora para terminar e que nos irradiam alegrias, motivações e conforto.

sábado, fevereiro 17, 2007

Entrevista: José Roberto Santos Neves


Quando o papo é bom, passa rapidinho o tempo. Foi assim o clima da entrevista com o jornalista do Caderno Dois, jornal A Gazeta, José Roberto Santos Neves que recentemente publicou seu livro "MPB de conversa em conversa". Durante os 42 minutos de bate papo, segundo meu gravador, José falou um pouco sobre a sua paixão pela música, compartilhou alguns conselhos para os aspirantes a jornalista e reafirmou seu amor por Clara Nunes e Maysa. Além dele discutir a importância de se manter a memória deste país por meio de biografias. Confira abaixo o resultado de tudo isto. Na próxima edição, a resenha do Livro.

Cinemaecriatividade: Conte nos um pouco sobre a sua história com a música.
JRN: Isto vem de berço. Cresci ouvindo Maysa, Dolores Duran, Bossa Nova, Ary Barroso. Quando cheguei a adolescência passei a ouvir muito rock, influenciado pelo meu irmão mais velho que é guitarrista. Eu toco bateria e já participei de alguns grupos como The Rain(1994) e Big Bat Blues Band(2006). Aprecio muito o rock dos anos 70, Iron Maden, Deep Purple, Scorpion. Já dos anos 80, curto bastante Paralamas, Lobão e Renato Russo.
Cinemaecriatividade: Desde quando surgiu este interesse especial pela MPB?
JRN: Quando era criança ouvia muito caetano, Gil, Rita. Profissionalmente, esta paixão surgiu na década de 90, como estagiário e depois repórter para a página Fanzine voltado para o público jovem. Na época o rock era pouco representado nas páginas culturais do Estado. Hoje, acredito que o problema seja representar o interesse musical do pessoal ente 40 e 50 anos.
Cinemaecriatividade: Quantos e quais livros ligados a música , você já publicou?
JRN: Dois Volumes. O primeiro foi a biografia sobre a cantora Maysa. Esta foi uma experiência maravilhosa, afinal a biografia é uma grande reportagem jornalística. O segundo foi MPB, de conversa em conversa, que conta a minha experiência no contexto musical.
Este não é um bê-a-ba, está mais para um manua,l sem muitas regras, cujo o objetivo é contribuir com alguns procedimentos que deram certo.
Cinemaecriatividade: Quais as características, você acredita que fazem de um jornalista, um bom entrevistador?
JRN: Ele tem que ser chato. (risos). Tem que acreditar, fuçar tudo. Tratar a pauta(NE: roteiro para uma matéria jornalística) como se fosse a coisa mais importante da sua vida. O ideal é você ler o máximo de informações sobre o entrevistado, inclusive fazer pesquisa no Cedoc do jornal(NE: Centro de banco de informações já publicadas sobre determinada pessoa ou assunto). O legal é conhecer o material do artista bem, para na na hora de fazer as perguntas conseguir criar uma perspectiva histórica dele e não ficar só no factual. Acredito que o jornalista é um porta-voz. Portanto, ele tem, muitas vezes, a missão de desvendar a leitura do trabalho do artista. Logo, o jornalista cultural não pode ser escravo do factual. Aconselho a mesclar as perguntas opinativas e cotidianas.
Cinemaecriatividade: A exemplo de Ângela Ro-ro que foi grande influente", mesmo que indiretamente, na idealização do livro, como você lida com as pessoas que são "low - profile"? Você tem algum mantra?
JRN: Não tive muitos problemas com artistas vaidosos. Ângela não estava numa boa fase da carreira quando a entrevistei. O importante é ter jogo de cintura e se preparar bem para uma entrevista. Se o entrevistado sentir que o jornalista não estudou a lição, ele se torna apático. Isto aconteceu comigo na entrevista da Elba(Ramalho), pois não tive muito tempo para ouvir o novo disco, ela percebeu isto e foi muito chato realmente.
Cinemaecriatividade: No seu livro, o assunto "Samba" está muito presente nas discussões. ISto foi algum tipo de homenagem?
JRN: A idéia era mostrar a história, através da MPB. Com o surgimento do samba no século XX, veio a chegada do disco. Nos anos 30 e 40, se deu o aparecimento dos cantores de vozeirão. Já os anos 50, foi marcado pela transição do samba-canção para a bossa nova. Na ditadura, muitas canções e movimentos musicais de protesto. Não quis me fechar no termo tradicional MPB. O samba é o símbolo da identidade nacional. Acredito que ele é a expressão máxima da população. Como foi dito em uma música por Nelson Sargento:
"O Samba agoniza, mas não morre"
Hoje, existe sambanejo, com estas letras sofríveis. Apesar de todas as dificuldades, o samba se mantém vivo. Um bom exemplo é o fato de depois da invasão da disco music, alguns artistas criaram o Clube do Samba e este se renovou.

Cinemaecriatividade: Uma das entrevistas mais ácidas foi a de Ivete Sangalo, principalmente pela afirmativa "Tenho 28 anos e ainda não tenho experiência suficiente para distinguir a boa música da medíocre. Qual o impacto deste posicionamento para o reconhecimento dela como cantora de MPB e não de axé music?
JRN: Ela está muito acostumada com a frivolidade e a fofoca.
A imprensa capixaba, normalmente, só pede para o artista mandar recado para os fãs locais e fica nestas amenidades
Como eu expus um confrontamento sadio entre jornalista e entrevistado, ela rodou a baiana, literalmente, e perdeu a compostura. Ivete se posicionou como cantora de Axé Music.
Ela tem potencial para ser cantora de MPB. Quando saiu da Banda Eva, asssisti a um show dela em 97 e fiquei animado pelo fato dela ter cantado Gil, Elvis, Simonal, Cassiano e Black Music brasileira.
Contudo, seu primeiro cd foi um decepção. Hits como canibal são muito fracos e sem qualidade musical.
Cinemaecriatividade: Em virtude, de matérias bem apuradas, em dois momentos espec[ificos, você conseguiu a atenção de astros da MPB como Adriana Calcanhoto e Caetano Veloso? Como estes acontecimentos afetaram a sua carreira e o reconhecimento dos colegas de profissão?
JRN: A conquista da credibilidade vai aos poucos. O reconhecimento deles foi maravilhoso, mas é o conjunto de obras. No caso de Caetano, o melhor foi a questão do "furo"(NE: exclusividade de um jornal em antecipar uma divulgação de um fato) na concorrência, pois eles nem chegaram a cobri, já que Caetano não iria, inicialmente, ceder entrevista.
Com a Adriana, o prestígio foi diferente, pois fui convidado para uma coletiva(NE: formato de entrevista) com apenas 1 jornalista do Rio, outro de São Paulo e um do Rio Grande do Sul, estado dela. Isto me valorizou perante as fontes.
cinemaecriatividade: Em relação ao passado, anteriormente, você disse que gostaria de ter entrevistado Clara Nunes e Maysa. Atulamente, na geração ainda viva, quem entra para a sua lista de músicos almejados?
JRN: Acho que o Chico Buarque, Mônica Salmázio, Tereza Cristina, alguns grupos de choro. A gravadora Biscoito Fino tem feito um trabalho belíssimo. Eu prefiro ficar com os mortos(risos). A gente é muito carente de memória. Gostaria de contribuir para evitar que esta perda de referência histórica aconteça. Por isso, acho maravilhosa a idéia de biografia. É um trabalho de pesquisa que você não tem a fonte principal, portanto tem que garimpar e vascular a discografia do artista. Para mim, a Maysa foi um projeto muito especial. Sou apaixonado pela Clara Nunes e pesquiso a vida dela.

* foto arquivo do autor

6 Comments:

At 12:46 PM, Anonymous Anônimo said...

"A imprensa capixaba, normalmente, só pede para o artista mandar recado para os fãs locais e fica nestas amenidades"

mas foi a imprensa do ES quem inventou isso? É privilégio só dela? Que honra!

 
At 4:28 PM, Anonymous Anônimo said...

Muito boa essa entrevista:)
Um beijo,
Manu

 
At 4:36 PM, Blogger juliana batista said...

Não disse em momento algum que isto é particularidade da imprensa capixaba. O entrevistado só evidenciou uma realidade. A maioria das entrevistas com artistas, de fato fica nas amenidades. Logo, é fundamental aprender a fazer entrevistas mais profundas no jornalismo cultural local.

 
At 11:23 PM, Anonymous Anônimo said...

Olá, Juliana

Parabéns pela entrevista e pelo blog. Sobre a crítica à imprensa citada no diálogo, quero destacar que ela se refere ao ES pelo fato de o livro reunir entrevistas feitas no Estado, sendo, portanto, a visão de um jornalista capixaba sobre a MPB. Mas, infelizmente, devo dizer que a crítica tb abrange parte da imprensa nacional...
Abçs a todos

 
At 7:15 PM, Blogger Fabio Malini said...

Juliana,

Que legal o seu blog. Muito boa a entrevista. Logo, logo vai aprender a fazer seu podcast (na disciplina deste semestre).

Malini

 
At 7:16 PM, Blogger Fabio Malini said...

I love Teresa Cristina e seu jeitinho de cantar de olhinho fechado lá no Carioca da Gema. na Lapa... tudo de bom, mesmo...

Boa entrevista, hem!

 

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